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Morte e Renascimento - Texto por Ramana Maharshi

Morte e Renascimento - Texto por Ramana Maharshi

Em nenhum outro ponto Ramana mostrou mais claramente que a teoria deve ser adaptada ao nível da
compreensão do buscador do que quando ele respondia perguntas sobre a morte e renascimento.
Para aqueles que eram capazes de compreender a teoria não dualista em sua forma pura ele apenas
explicava que esta pergunta não surge, pois como o ego não tem uma existência real agora, também não o terá após a morte.

P: As ações de uma pessoa nesta vida afetam os seus nascimentos futuros?

R.: Você nasceu? Por que você se preocupa com nascimento s futuros? A verdade é que não existe
nascimento e nem morte. Que aquele que nasceu pense sobre a morte e outros consolos para ela.

P.: A doutrina Hindu da reencarnação é correta?
R.: Não é possível dar uma resposta definitiva. No Bhagavad Gita, por exemplo, até a presente
encarnação é negada.

P.: A nossa personalidade não é sem começo?
R.: Primeiro descubra se ela existe e depois faça a pergunta. Tanto os dualistas quanto os não
dualistas concordam que a Auto-Realização é necessária.
Primeiro atinja-a e depois faça outras perguntas. Dualismo ou não-dualismo – isso não pode ser
resolvido por meio de teorias apenas. Se o Eu Real for realizado, esta pergunta não surgirá.
Tudo o que nasce deve morrer; tudo o que é adquirido será perdido.
Você nasceu? Não, você existe eternamente. O Eu Real nunca pode ser perdido. Ramana,
desencorajava a preocupação com esses temas metafísicos, já que eles apenas distraem a pessoa do
esforço de realizar o Eu Real aqui e agora.
Para que perguntar sobre o que acontece após a morte? Para que perguntar se você nasceu ou não, se
você colhe os frutos de seu karma passado ou não? Você não terá essas perguntas daqui a pouco
quando estiver dormindo. Por quê?
Por acaso você agora é uma pessoa diferente do que era e nquanto dormia? Não, você não é. Descubra porque essas perguntas não surgem quando você está dormindo.

No Bhagavad Gita Sri Krishna primeiro diz a Arjuna que ninguém nunca nasceu e depois que “você e eu já passamos por inúmeras encarnações. Qual dessas declarações é verdadeira?
O ensinamento varia de acordo com a compreensão do ouvinte.
Quando Arjuna disse que não iria lutar contra e matar seus parentes para conquistar o reinado, Sri
Krishna disse: “Não é que estes, você ou eu, não éramos antes, não somos agora, nem seremos depois.
Ninguém nasceu, ninguém morre e não será assim daqui para a frente.”
Essas declarações parecem contraditórias, mas cada uma é verdadeira de acordo com o ponto de vista
do ouvinte. Cristo também disse “Antes de Abraão ser, eu sou.”

Assim como nos sonhos você acorda depois de várias experiências novas, também depois da morte um novo corpo é encontrado.
Assim como os rios perdem a sua individualidade quando desaguam no oceano, e mesmo assim as águas evaporam e descem como chuva de volta para o rio e depois para o oceano, os indivíduos também perdem a sua individualidade quando vão dormir, mas reto rnam novamente de acordo com as suas tendências inatas prévias. Similarmente, na morte o ser também não é perdido.

Veja como uma árvore cresce novamente depois de seus galhos serem cortados. Enquanto a fonte da
vida não é destruída, ela continua crescendo. Da mesma forma, no momento da morte as tendências
latentes retornam ao coração, mas não são destruídas. É assim que os seres renascem.
No entanto, de um ponto de vista mais elevado ele responderia: Em verdade não existe nem semente
nem árvore – existe apenas Ser. Ocasionalmente ele explicava o processo mais detalhadamente, mas
sempre com a ressalva de que na verdade só existe o Eu imutável.

P.: Quanto tempo dura o intervalo entre a morte e o renascimento?

R.: Pode ser longo ou curto, mas o Homem Realizado não passa por isso; ele é absorvido diretamente
pelo Ser Infinito.
Alguns dizem que, após a morte, aqueles que tomam o caminho da luz não mais renascem, enquanto que aqueles que tomam o caminho da escuridão renascem depois de ter colhido os frutos do seu karma em seus corpos sutis.
Se os méritos e deméritos de um homem são iguais ele renasce imediatamente na Terra; se os seus
méritos superam seus deméritos ele primeiro vai ao céu em seu corpo sutil, já se seus deméritos
superam seus méritos ele vai primeiro ao inferno.
Mas em ambos os casos ele renasce posteriormente na Terra. Tudo isso é descrito nas escrituras, mas
na verdade não existe nem nascimento nem morte; cada um simplesmente permanece como realmente é. Apenas isso é a Verdade.

Deus em sua misericórdia não revela este conhecimento às pessoas. Caso estas soubessem que haviam sido virtuosas no passado ficariam orgulhosas, ou então ficariam desanimadas por seus deméritos.
Ambos são ruins. Basta conhecer o Eu Real.
Uma pessoa competente, que talvez já tenha se qualificado em encarnações passadas, compreende a
verdade e fica em paz após ouvi-la apenas uma vez, enquanto outras que não são tão qualificadas têm
que passar por vários estágios antes de alcançar o samadhi.

Isso quer dizer que uma encarnação pode ser encarada como um dia de peregrinação rumo à Auto-
Realização. Quão perto ou longe se está do objetivo final depende do esforço feito em dias passados;
quanto vai se avançar depende do esforço feito hoje.
O sono é o estado intermediário entre dois estados de vigília, da mesma maneira que a morte é o
estado intermediário entre dois nascimentos. Ambos são impermanentes.
Após a morte, o espírito não é descorporificado, apenas toma um corpo diferente. Se ele não estiver
no corpo grosseiro estará em um corpo sutil, como no sono e no sonho acordado.
O Eu Real é contínuo e não é afetado por nada. O ego que reencarna pertence ao plano inferior, o do
pensamento. Ele é transcendido pela Auto-Realização.
Perguntaram a Ramana se era possível conhecer o estado póstumo de um indivíduo, ele disse: é
possível, mas para que tentar? Esses fatos são tão irreais quanto a pessoa que os vê.

P.: O nascimento de uma pessoa e sua vida e morte são reais para nós.

R.: Sim, como você erroneamente se identifica com o corpo você pensa o outro como sendo um corpo também. Mas nem você nem ele são um corpo. O nascimento do pensamento “eu” é o nascimento da pessoa, e a sua morte é a morte da pessoa. Depois de surgir o pensamento “eu”, a errônea identificação com o corpo também surge.
Assim como você pensa que o seu corpo nasceu, cresceu e vai morrer, você também pensa que o corpo do outro nasceu, cresceu e morreu. Você pensava sobre o seu filho antes dele nascer? O pensamento veio depois dele nascer, e continua após sua morte.
Ele só é o seu filho na medida em que você pensa nele.

Para onde ele foi? Para a fonte de onde ele surgiu. Enquanto você continuar existindo ele continua
também. Mas se você deixar de se identificar com o corpo e realizar o Eu Real essa confusão
desaparecerá.
Você é eterno, e verá que os outros também o são. Enquanto isso não for realizado haverá sempre a
tristeza e o desgosto, fruto dos falsos valores que são produzidos pelo conhecimento errôneo e pela
identificação errônea.
O que importa para vocês quem morre ou o que é perdido? Morram vocês mesmos e se percam,
tornando-se assim, com a extinção do ego, um com o Eu de todas as coisas.

As religiões dão importância ao estado mental em que a pessoa morre, e a seus últimos pensamentos
antes da morte. Mas Ramana alertava as pessoas que é preciso estar bem preparado antes, caso
contrário tendências mentais indesejáveis podem surgir de maneira incontrolável.
No Bhagavad Gita é dito que o último pensamento de uma pessoa no momento da morte determina o
seu próximo nascimento. Mas é necessário experimentar a Realidade agora, nesta vida, a fim de poder experimentá-la no momento da morte.

Reflita se este momento é de qualquer maneira diferente do último momento na morte, e tente estar
no estado desejado.

- Livro Quem sou Eu? de Ramana Maharshi




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