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CORAÇÃO E MENTE diálogo com Ramana Maharshi

CORAÇÃO E MENTE diálogo com Ramana Maharshi

Aqui parece ser o local adequado para expor o ensinamento do Maharshi sobre a
mente e o coração. Ele ensinou que o Coração, e não a mente, é o verdadeiro centro da
Consciência. Mas por “Coração” ele não quis dizer o órgão físico no lado esquerdo do
peito, mas o coração espiritual no lado direito, e por “Consciência” ele não quis dizer
pensamento, mas sim a pura Consciência ou o sentimento de ser. Ele descobriu por
experiência própria ser este o centro da consciência espiritual, e, posteriormente, viu sua
experiência confirmada em algumas escrituras antigas. Quando Bhagavan instruía seus
devotos a se concentrarem no Coração era para este coração espiritual, no lado direito do
peito, que ele estava apontando. Os seus devotos experimentavam-no como um centro real,
quase físico, de vibração da Consciência. Contudo, ele também falava do Coração como
equivalente ao Eu Real, e lembrava-os de que na verdade ele não está em absoluto situado
no corpo, mas que transcende o espaço.
D.: Por que você diz que o coração no lado direito do peito se os médicos sabem que
ele é na esquerda? Que autoridade você tem?

B.: Ninguém nega que o coração físico está no lado esquerdo do peito, mas o Coração
do qual eu falo fica no lado direito. Esta é a minha experiência e eu não exijo nenhuma
autoridade para ela; mesmo assim você pode encontrar uma confirmação dela em um livro
Malayali sobre Ayurveda e também no Sita Upanishad.

Dizendo isto o Bhagavan mostrou a citação do Sita Upanishad e citou de memória a
do livro sobre Ayurveda. Às vezes, quando perguntado, ele também mencionava o texto
Bíblico do Eclesiastes: “O coração do sábio está na mão direita e o do tolo na esquerda”.2
D.: Por que nós devemos ter um local, como o coração, para nos concentrar durante a
meditação?
B.: Porque você busca a Consciência verdadeira. Onde você pode encontrá-la? Você
pode alcançá-la fora de você mesmo? Você deve encontrá-la interiormente, e por isso você
é direcionado para o interior. O Coração é o centro da Consciência ou a Consciência em
si.

Eu lhe peço para observar onde o “eu” surge no seu corpo, mas não é muito certo dizer
que o “eu” surge e retorna ao lado direito do peito. “Coração” é outro nome para a
Realidade, e esta não está nem dentro e nem fora de seu corpo. Como apenas Ela é, não
existe “dentro” e “fora” para Ela. Por “coração” eu não quero dizer nenhum órgão
fisiológico ou plexo ou nervos ou qualquer coisa do gênero; porém, enquanto o homem se
identifica com o corpo ou pensa que é o corpo ele é aconselhado a observar aonde no corpo
o pensamento “eu” surge e desaparece. Só pode ser no lado direito do peito pois qualquer
homem, de qualquer raça ou religião, não importando a língua que fale, aponta para o lado
direito do peito para referir-se a si mesmo quando ele diz “eu”. Isso é assim em qualquer
parte do mundo, então esse deve ser o local. E, observando intensamente o surgimento do
pensamento “eu” quando se acorda, e o seu retorno no momento de se pegar no sono,
pode-se ver que isso acontece no coração no lado direito do peito.

Quando uma sala está escura você precisa de uma lâmpada para iluminá-la, mas
quando o sol nasce você pode ver os objetos claramente sem fazer uso dela. E para ver o
sol nenhuma lâmpada é necessária pois ele é auto-luminoso. O mesmo se dá com a mente:
para ver os objetos é necessária a luz refletida da mente, mas para ver o Coração basta
voltar a mente para ele. Então a mente se perde e só o Coração resplandece.5
É uma prática tântrica concentrar-se em um dos chakras ou centros espirituais do
corpo, em geral sobre o ponto entre as sobrancelhas. Como será mostrado em um capítulo
mais adiante, o coração no lado direito do peito não é um destes chakras; no entanto, na
passagem que segue Bhagavan explica brevemente que a concentração sobre o centro do
coração é mais eficaz do que a concentração sobre qualquer chakra, mas menos eficaz do
que a auto-inquirição pura.

D.: Dizem que existem seis órgãos sutis de cores diferentes situados no peito, dos
quais o coração espiritual é o que reside no lado direito do peito, dois dedos do centro. Mas
também dizem que o coração é sem forma. Isso significa que nós deveríamos imaginar que
ele tem uma forma e meditar sobre ele?
B.: Não; apenas a busca “Quem sou eu?” é necessária. É o mesmo Ser que continua
existindo tanto no estado de sono como no de vigília; mas no estado de vigília existe a
experiência da infelicidade e, portanto, o esforço para removê-la. Quando lhe perguntam
quem acorda do sono você diz “eu”. Segure firme este “eu”. Se isso for feito o Ser Eterno
revelará a Si mesmo. A coisa mais importante é a investigação do “eu”, e não a
concentração no coração. Não existe “interior” e “exterior” – ambas as palavras significam
a mesma coisa ou nada em absoluto. Entretanto, também existe a prática da concentração
no centro-coração, que é uma forma de exercício espiritual. Apenas quem se concentra no
centro-coração pode permanecer consciente quando a mente cessa sua atividade e
permanece imóvel, sem pensamentos. Aqueles que se concentram em qualquer outro
centro não conseguem manter a consciência vazia de pensamentos, mas apenas deduzir que
a mente estava imóvel depois da mesma ter voltado à atividade.

Na passagem que segue uma senhora inglesa comenta sobre essa consciência livre de
pensamentos, e o Bhagavan aprova.

D.: Os pensamentos repentinamente cessam e o “eu-eu” surge igualmente de forma
repentina e permanece. Isso é só um sentimento, não um pensamento. Isso está correto?
B.: Sim, é bem assim. Os pensamentos devem cessar e a razão desaparecer antes do
“eu-eu” surgir e ser sentido. O sentimento é o principal, e não a razão.
D.: Além disso, isso é sentido no lado direito do peito, e não na cabeça.
B.: É aí que deve ser sentido, pois o coração fica aí.
D.: Mas quando eu olho para fora ele desaparece. O que eu devo fazer?
B.: Segure-o firmemente.

Isso não significa que o pensamento é impossível durante o estado de consciência
“Eu-Eu”, como é prova o próprio Bhagavan, que vivia constantemente neste estado. Para o
ignorante o pensamento é como uma nuvem densa bloqueando-lhe a luz do sol. Quando o
topo da nuvem se abre, deixando assim a luz passar, nós podemos usar o pensamento sem
ser iludido por ele. Para usar outra metáfora, o Bhagavan às vezes comparava a mente de
um Homem Realizado à lua no céu durante o dia – ela está lá, mas a sua luz é
desnecessária, pois pode-se enxergar sem ela graças à luz direta do sol.



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